Limites

Limites

25.3.11

Citação


Com o devido crédito à Revista Vida Simples e a Eugenio Mussak, edição 103, março 2011



"Sagrada é a vida que vale a pena, que não compactua com o destrutivo, que não se contenta com o mínimo, que busca o excelente, que distribui compaixão, afeto livre, amor verdadeiro. Lugar sagrado é o próprio corpo, que merece cuidado; é a mente, que precisa de conhecimento; é a emoção, que precisa do belo. Lugar sagrado é o espaço ao nosso redor, que conquistamos com nossa própria energia, e que será tão maior quanto for nossa intensidade de viver."

Subscrevo sem alterar uma vírgula. Quando crescer, quero ser Eugenio Mussak.

17.3.11

(Ponto de) Inflexão



Também poderia chamar esse conjunto de linhas de "Curvatura" por dar tanto a expressão do peso que verga quanto da mudança de rota. Preferi a "Inflexão" porque, apesar de significar o mesmo, começa com as mesmas letras de "introspecção" e termina com as de "reflexão", o que de fato pretendo fazer": refletir para dentro.

À medida que a vida passa, experiências sucedem-se e fatos suicidam-se à minha frente. Sempre me disseram que quanto mais somos experimentados, maior a sabedoria e sempre um dia terminamos por entender dores e amores, a diagnosticar más intenções, a superar negações e frustrações, a sermos cada dia melhores, mais compreensivos e compassivos.

Por enquanto tenho a leve impressão de que a coisa funciona um pouco diferente. Quais não são os "a40tados" ou mais que, sólidos em suas carreiras e com as famílias definidas [definidas muitas vezes tragicamente por casamentos dilacerados - desfeitos precocemente ou carregados ao peso de correntes presas ao pescoço], não têm a mínima ideia de quanto tempo já caminharam perdidos no meio da mata e o quanto esse enclausuramento lhes custou de vida plena. Quantos e tantos, já na "idade do aguenta", não conseguem discernir marcas de cicatrizes mas gabam-se do peso dos anos, dos cabelos já apagados e das rugas de infelicidade que carregam como desculpa para seus rompantes de desamor.

Ainda não haviam me dito que a vida não é linear, no máximo cochicharam que ela traz surpresas. Sempre ouvi que o acúmulo de anos, de relacionamentos e de histórias era um estoque inexorável de conhecimento, uma verdadeira preparação que o ciclo natural nos impunha para instruirmos e conduzirmos nossas relações em suas complexidades singulares e evolutivas.

Esqueceram-se de me segredar que todo esse cansativo condicionamento mental e emocional, muitas vezes de nada serve e para nada presta senão para fazer-nos penitenciarmo-nos por achar que permanecemos imensamente despreparados e incompetentes para lidar com as nossas próprias limitações, para criarmos laços maduros, densos e sinceros. Esqueceram-se de me dizer que enquanto nos condicionamos até fisicamente para os anos da maturidade, ficamos absortos em engano porque não há quem possa preparar-se para o imprevisto.

"Sim, nós podemos!" aprender a conhecer nossas reações, nossas deficiências e dirigir nossas ações a fim de que elas moldem o nosso caráter. "Sim, nós podemos!" escolher a forma como nos portaremos ainda que não nos seja dado escolher a estrada que trilharemos. Sim, nós DEVEMOS separar tempo para o autoconhecimento e intensa, constante, interminável e árdua tarefa de sermos absolutamente sinceros conosco, assumindo todos os nossos defeitos, desvios de caráter, todos os desejos impronunciáveis e pensamentos despojados de qualquer virtude que vivem ao redor dos nossos ideiais antigos que, mesmo belos, foram sufocados pelo homem ingrato que acabamos nos tornando.

Se tornamo-nos ingratos é porque deixamos orgulho, vaidade e ira apossarem-se dos nossos punhos para serem os vigadores da nossa fama. Mas volto a dizer o que não me disseram: nós podemos. Moldar o caráter é sim uma tarefa diária e de uma vigilância constante. Ainda que o seu desejo mais natural, que o seu instinto mais profundo seja o de querer bem, o de ser estritamente ético e inabalável, isso não é definitivo. Ainda que a bondade seja seu sobrenome, ainda que o mal pronunciar jamais tenha feito parte do seu vocabulário até hoje, tenho certeza ao dizer que moldar o caráter é sim uma tarefa diária e inacabada.

Nossas boas intenções sempre serão tentadas, nossa ética sempre será colocada à prova, nossa vaidade sempre será instigada até o dia em que uma fresta permita que a despressurização dê início à nossa queda.

Meus amigos, o caráter é MUTÁVEL e isso é bom. Bom para que saibamos que nenhum bem existente em nós procede de nós mesmos, bom para que saibamos que somos propensos a querer o mal, a cobiçar a riqueza alheia e que, mesmo diante dos deslizes que essas deficiências podem carregar, ainda temos chance de recomeçar e termos os nossos caráteres remodelados para buscar uma reação diferente quando a vida nos aprontar outra de suas imprevisões.

Até hoje a minha história de vida não me permitiu ser equilibrado, coerente, manso ou sábio para aconselhar e confortar os conhecidos a quem amo e os desconhecidos que posso vir a amar. Sei apenas que tenho precisado, ou melhor, tenho tido a mais extrema NECESSIDADE de conhecer-me profundamente, em ter meus instintos perscrutados, meus sonhos verdadeiros descortinados para poder assumir-me diante de mim e dos outros sem enganos, sem estratégias de conquista, sem aparência de promessas que não poderei cumprir.

Definitivamente, ou pelo menos por hoje, não quero experiência nem conselhos a dar, quero apenas e como nunca conhecer os segredos do meu coração, os espasmos da minha alma e, com isso, definir meu caráter.